Passo os dias a aspirar
Este pó que anda no ar
É um bafio já antigo
Com cheirinho a Ultramar
Que é velho e que é novo
Sempre à espera de pousar
A mão dura sobre o povo
É um mofo pestilento
Invade paredes e redes
Quanto mais o espanar
Mais ele vai espalhar
Não nos permite pensar
Não nos deixa respirar
É um mofo que aí anda
E que é fácil de encontrar
Pelo tanto que tresanda
A chorrilho de mentiras
Consagradas nas partilhas
O que é verdade não é
Verdade que é mentira
Mentira que é verdade
Verdade a arder na pira
São danças e contradanças
com a mesma verborreia
Entranham no pensamento
escorregam para a veia
O que é verdade não é
Verdade que é mentira
Mentira que é verdade
Verdade a arder na pira
E as gentes a assistir
São como as avestruzes
Deleitadas com as luzes
Embeiçadas pelas cruzes
Não vêem os capuzes
Dos algozes que aí vêm
Os carrascos da verdade
Que na mão já as têm
E que pela gola as levam
Para um novo cadafalso
Moderno e sempre antigo
Jurando a verdade no peito
Louvando tudo o que é falso
Sem parar e sempre a eito
Passo os dias a aspirar
Mas o engenho vai falhar
Não há luz que aguente
Tanto pó a entranhar
O que é verdade não é
Verdade que é mentira
Mentira que é verdade
Verdade a arder na pira
(2021)
domingo, 10 de março de 2024
Do pó viemos, ao pó voltamos
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